Diretora médica do Pro Criança Cardíaca, Dra. Isabela Rangel foi convidada para a LIVE do dia 5 de junho da série “Quem faz o Rio?”, apresentada por Renata Polacow, da Agência Rio Experts. Isabela falou sobre sua trajetória profissional e sobre a instituição onde trabalha há mais de duas décadas.

Casada, mãe de três filhos – Juliana, Pedro e Gabriela – Isabela nasceu no Rio de Janeiro, formou-se em Medicina em 1991 e, desde o início da faculdade já sabia que queria ser pediatra. Fez residência em Pediatria e Neonatologia e, nesta época, conheceu a Dra. Rosa Célia, que montava, então, um grupo de médicos intensivistas para atuar no pós-operatório de cirurgias cardíacas.

“Ela me convidou e eu entrei na cardiologia pediátrica, era pediatra intensivista. Depois Dra. Rosa me convidou para fazer parte da equipe dela, no consultório particular. Eu atendia as crianças para que ficassem o mais saudáveis possível para a cirurgia cardíaca. Fui me encantando pela área e decidi fazer nova especialização, desta vez, três anos de Cardiologia Pediátrica no Hospital Pedro Ernesto”, relembra.

Acompanhe aqui a conversa informal da LIVE:

 

O projeto 

“Cada vez mais apareciam crianças carentes no consultório da Dra. Rosa. As famílias iam até ela pedindo ajuda, porque não conseguiam atendimento no serviço público. A demanda cresceu tanto que chegamos a reservar um dia inteiro de consultório para essas crianças, que não tinham convênio, nem condições de pagar por consultas particulares. Fazíamos a avaliação cardiológica, o eletro, o ecocardiograma, mas, quando havia a necessidade do cateterismo, da cirurgia, não tínhamos para onde enviar. Eles tinham que voltar para a rede pública e isso causava uma angústia muito grande na equipe.

Aí, a Dra. Rosa disse que teve um sonho: um tabuleiro grande xadrez onde faltavam peças e ela não conseguia jogar. Ela percebeu que eram essas crianças carentes que não tinham para onde ir e pensou: ‘eu tenho que colocar as peças nesse tabuleiro’. Arregaçou as mangas e começou a batalha para criar o Pro Criança Cardíaca, fundado em 1996. Tenho muito orgulho de ter participado dessa história, desse sonho, dessa realização.”

A instituição

“Somos uma ONG, uma instituição médico-social, temos todos os títulos que geram credibilidade, de utilidade pública, municipal estadual e federal; também temos o registro no Conselho Municipal do Direito da Criança e do Adolescente. Nossa sede foi fundada em 2001, em Botafogo, graças a doações e parcerias. Um amigo da Dra. Rosa, que gostava muito do trabalho dela, doou o primeiro cheque para comprarmos a casa que abriga a sede.

Eu atuo como cardiopediatra junto com outras médicas. Fazemos avaliação clínica, diagnóstico e manejo dessas crianças. Desde 2014, também sou Diretora Médica da instituição, ajudando a Dra. Rosa a tocar o projeto. A criança chega no Pro, fazemos a avaliação. Se ela tiver alguma doença, vai ser acompanhada até a fase adulta – até 18 anos, tem alguns que ficam um pouco mais com a gente.”

A logomarca

“Mudou ao longo dos anos, assim como o projeto se reinventou. Inicialmente, era um vasinho, a flor e um único coração, que representava a criança carente. A flor foi uma forma de homenagear a doutora Rosa, pelo nome dela. O vaso representa a base sólida, o projeto.  E ao longo dos anos, ganhamos mais alguns corações, que também representam a generosidade do ser humano, que doa seu coração em prol do nosso projeto.”

A estrutura

“A doutora Rosa é a presidente da instituição, a Mitzy é a diretora executiva e, contando comigo, somos cinco médicas atuando na cardiopediatria. Nós temos 16 colabores fixos, entre as áreas de administração, financeiro, contabilidade, RH e comunicação. E temos os voluntários: dentista, dermatologista, nutricionista e psicóloga. Além de sete voluntários para serviços gerais, como contadores de histórias. São pessoas que vão para ajudar na organização das doações, dos eventos. Fora isso, temos os médicos que não trabalham na sede, mas que dão suporte na cirurgia cardíaca. Nós temos a equipe dos cirurgiões, anestesistas, arritmologistas e hemodinamicistas. Isso tudo é feito a nível hospitalar. Sobre os dentistas: nos pacientes que têm doenças cardíacas, há uma incidência maior de endocardite bacteriana, por isso a saúde bucal deles é muito importante.”

Os voluntários

“A gente é aberto pra quem quiser se doar. Eu acho que esse trabalho voluntário é muito bonito e sempre tem alguma coisa que você pode trazer para essas crianças. As pessoas podem entrar em contato por telefone, ou por email, no nosso site. A gente tem Instagram e Facebook, onde podem pedir mais informações. E a nossa casa está aberta para que todos possam conhecer o Pro Criança.”

Os atendimentos

“Atendemos todos que precisam da avaliação. É um projeto 100% gratuito, então só atendemos pacientes que não têm condições de pagar um convênio, ou uma consulta particular. São pessoas que têm um nível socioeconômico um pouco mais comprometido. A nossa equipe também atende no consultório privado da Dra. Rosa, na Clínica Cardiológica Infantil (CCI). As consultas particulares e por convênio são feitas na CCI.”

Patologias cardíacas mais comuns nas crianças

“Depende muito da patologia de base. Existem doenças cardíacas em que as crianças são assintomáticas, por isso o acompanhamento pediátrico é muito importante. Na consulta clínica, o pediatra tem condições de avaliar se a criança apresenta algum sinal indicativo de alguma cardiopatia e encaminha para o cardiologista. A gente também sempre aconselha a todas as crianças, principalmente as assintomáticas, a terem pelo menos uma avaliação cardiológica.  E existem as patologias, algumas até bem complexas, em que os pacientes têm sintomas.

Podemos dividir, de uma forma mais simples, para que todos possam entender, em doenças cardíacas de hiperfluxo pulmonar, ou seja, vai muito fluxo sanguíneo para o pulmão e essas crianças podem ser mais cansadas, ter uma respiração mais rápida. Aquela criança que vai mamar, ou brincar e cansa. Tem o que as pessoas chamam de “respiração de cachorrinho”. E essas crianças devem fazer uma avaliação cardiológica. Existem as cardiopatias de hipofluxo pulmonar, que são aquelas onde você tem uma oxigenação mais baixa e essas crianças são roxas – cianóticas, mais arroxeadas. Elas também apresentam um cansaço para determinadas atividades. Por exemplo, bebezinhos que na hora de mamar ficam bastante cianóticas e a mãe percebe que tem algo diferente.”

Como lidar?

“A gente sempre orienta os pais, principalmente em relação às crianças que têm mais limitações, que mesmo após uma cirurgia, elas não vão poder fazer atividades muito intensas. A gente sempre sugere que os pais estimulem, lógico, o estudo, mas também alguma atividade mais lúdica: música, artesanato, pintura. Coisas em que a criança possa se sentir também útil. Essa é uma outra questão que a gente tem que trabalhar muito, para que eles não se sintam tão diferentes, excluídos.”

O que é atresia tricúspide?

“É quando você tem uma má formação na válvula tricúspide, do lado direito do coração. A válvula é como se fosse uma porta que abre para o sangue passar, e fecha para o sangue não voltar. Quando você tem essa doença, você tem uma deformidade na válvula que impede que o sangue passe do átrio direito para o ventrículo direito, com isso não vai fluxo para o pulmão. Essas crianças, muitas vezes, precisam ser operadas nos primeiros meses de vida. Precisamos avaliar se podemos esperar um pouquinho mais. Normalmente a atresia é bem associada com outras malformações intracardíacas.”

Inspiração

“A Dra. Rosa, não tem como não se inspirar com ela, que faz um trabalho tão lindo e a história de vida dela também é muito linda. Ela é a minha grande inspiração.”

Prêmios

“Em 2019, participamos pela primeira vez do “Melhores ONGs”, que é um selo dado pelo Instituto Doar e foi uma grande honra. Foi a primeira vez que participamos e conseguimos nos classificar, foi muito gratificante. Além disso, em 2005, ganhamos o Prêmio São Sebastião de Cultura, categoria Ação Social. Em 2006, o Prêmio Faz Diferença, na categoria Ciência e Vida. Em 2007, o Prêmio Cariocas do Ano, na categoria Voluntária. Em 2008, a Medalha Pedro Ernesto, a mais importante comenda do município, que foi oferecida pela Câmara dos Vereadores. Em 2010, o Prêmio Atitude Carioca. Em 2011, a Medalha Tiradentes, pela Assembléia Legislativa. E em 2019, a Dra. Rosa também foi reconhecida pelo trabalho no Pro Criança, com o Prêmio Personalidade do Ano, na área de saúde. É para se orgulhar, não é?”

Abrangência da ONG

“O nosso foco é o estado do Rio de Janeiro. A gente têm alguns pacientes, que são de fora do Rio, mas é porque eles moraram aqui e acabaram mudando.”

Eventos e campanhas

“Sempre tentamos fazer alguns eventos, até para arrecadar mais doações, e fazemos campanhas também, para doações de mantimentos, por exemplo, porque oferecemos cesta básica para todas as crianças que tratam conosco. Todo mundo, no final da consulta, vai para casa com medicamento, cesta básica e brinquedo. Por isso fazemos muitas campanhas para arrecadar: leite, fralda, produtos de higiene bucal e também para complementar as cestas básicas. Temos essa ação em que você doa e nós te damos um presente por essa doação.”

Patrocínios

“Alguns empresários nos apoiam. As doações são feitas por meio de pessoas jurídicas, físicas e pelo site. Oferecemos a opção de fazer a doação mensal, que são muito importantes, mantém o nosso projeto.”

A casa do Pro Criança

Ficou um espaço muito bacana, acolhedor, porque na verdade, é isso que o Pro Criança quer passar. A gente sabe que muitas vezes a gente não vai dar uma notícia boa para os pais, quando eles chegam pela primeira vez para fazer uma avaliação, e a gente tem que informar que a criança tem uma cardiopatia, ou que vai precisar operar, é uma notícia que impacta muito a família. Tentamos ser o mais humanas possível, acolhemos, tentamos não dar só a parte técnica, mas também trazer essa família pra perto, abraçar quando ela precisar, e dar todo o apoio necessário para que eles compreendam a doença, aceitem e possam, apesar da aflição, ter uma confiança no nosso trabalho e que possa ser mais leve essa trajetória da família.”

Envolvimento emocional

“É muito difícil, porque a gente acompanha toda a evolução. Quer dizer, a criança chega, a gente faz o diagnóstico, faz o acompanhamento clínico, essas crianças vão para cirurgia, retornam para o acompanhamento ambulatorial, então é uma vida. A gente vê essas crianças crescerem, não tem como não se emocionar.”

A live foi encerrada com os agradecimentos da Dra. Isabela: “Quero agradecer a todos os colaboradores do Pro Criança, todos que nos seguem, todos que nos ajudam em especial nesse período tão difícil da pandemia. Recebemos tanta generosidade, isso me deixou muito emocionada. O ser humano tem um coração fantástico e consegue se abrir e olhar para o próximo.”